segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Pausa para amar



Não quero ser mais uma poesia a falar da dor
Não quero falar da fome,
Não quero falar de adeus
Ou qualquer coisa igual.
Apenas quero falar do amor,
Algo tão normal...

Não quero falar de guerra,
Mas vejo homens tombando sobre a terra,
Irrigando-a com sal,
Mas quero apenas falar do amor,
Algo tão normal...

Vejo a Terra se abrindo,
Caças supersônicos singrando lá em cima...
Retrocedendo em minha memória
Vejo crianças queimadas em Hiroshima.
Super-homens sorrindo,
Gargalhada banal,
Mas quero apenas falar do amor,
Algo tão normal...

Falar da vida,
Pássaros em revoada,
Índios sem caraíbas
Agradecendo a seus Tupãs
Por mais uma alvorada
Todas as manhãs,
Mas vejo a devastação das matas,
Caçadores roubando a vida do Pantanal
E quero apenas falar do amor,
Algo tão normal...

Enfim, sou uma poesia tola
Tentando, entre tanta coisa original,
Falar apenas do amor,
Algo tão normal...

Marcos Alderico
21/02/1995

Aos poetas



Aos poetas sobrou a solidão do mar
O torpe movimento de sua ondas
Que guardam o reflexo do brilho
Das constelações

Aos poetas sobrou o encanto da Lua,
A magia das flores,
A alegria das cores,
A agonia e os prazeres
Que dão sabor aos amores

Aos poetas sobrou um canto
Nas estantes das salas
E um suave sabor de eternidade




Marcos Alderico
19/11/1998
9:36h

Cúmplices


Ouvi o Sol e ele me disse luz
Numa manhã em que a monotonia
Se adonava do canto do sabiá.
Minha rede ainda era preguiçosa
Quando a cabocla se foi, cedinho...
Éramos assim: cúmplices
O Sol, a monotonia, o sabiá a rede e eu.

Marcos Alderico
30/12/1997
17:20h

Poesias de Barro



Desejo uma poesia por minuto
uma rima por segundo
- um passo profundo
- de um poço fecundo.
Uma formiga tecendo árvores,
Criando mestres
À sombra de um pé de arte.
Não quero rimar valsa com salsa.
Antes, dor com blues,
Amor com pus

Marcos Alderico
01/10/1996
22:58h

O homem alfabetizado de ventos
Não escreve aranhacéus,
Planta beijaflores,
Cultiva répteis...
(inútil é entender poesias)


Marcos Alderico
01/10/1996
23:05h

Tinha um par de sapatos.
Joguei-os no ribeirão
E criei raízes no lodo.
Virei chão.

Marcos Alderico
01/10/1996
23:08h

O cheiro sutil das sombras
Engorda os olhos,
Esconderijo de tralhas.

Marcos Alderico
02/10/1996
8:49h


Uma singela homenagem ao poeta Manoel de Barros.

Canção para anjos em dó menor



Os nossos ídolos parecem estar sumindo
E nossos filhos com olhares perdidos
Procuram entender seus heróis

Estamos sós.
Estamos tão sós...

O dia está sorrindo
O céu está tão lindo
E mesmo assim não escuto a tua voz

Onde estarão nossos ídolos?
Onde estarão nossos heróis?
Onde andarão nossos líderes?
Onde andará nosso portavoz?

Vamos deixar nossas lágrimas rolarem
Para o oceano mais próximo e se misturarem
Com infinitas ondas em belos dias de calor
E veremos nossas crianças cantarem
Canções que acalentem essa dor

Vamos compor para cada Poesia uma flor
E fazer com que o soluço que cala o nosso grito
Traga um dia o infinito e nos leve à perfeição
Como um cara tão bonito
De sentimentos, alma e coração.

Vamos falar de anjos
E nos lembrar de Poetas alados
Então poderemos sem mais que homens e mulheres
Um dia quando nos encontrarmos com a Verdade
Então entenderemos que o verdadeiro pecado
É ter passado por esta vida
Sem ter jamais amado...




(assim foi o meu adeus ao poeta Renato Russo, em 13/10/1996, às 23:40h. Saudades...)

Imagens do tempo



Miro no espelho imagens tortas.
Reflexo do passado.
Estilhaços de mim
Que o Tempo, impiedoso e sapiente
Poupa para que eu continue mirando
Imagens mortas.

Fecho os olhos.

Para não ver o ardiloso Tempo passar,
Tranco as portas.
Tentativa em vão, ele passa.
Deixa em mim rastros de gozos e desertos.
Impávido, segue meu impiedoso algoz.
Envelhece minha pele narcisa.

Cansados vagueiam meus olhos
Na incompreensível eternidade,
Tentando fictos aceitá-la.
Meu cigarro consome-se ao vento.
Novamente é o Tempo
Que se vai sem rumo nem pressa.
Nessa nau sou passageiro e eterno.
Luto contra a morbidez do meu próprio luto.
Sobre mim desaba a areia degenerativa desta ampulheta.
Implacável, Cronos me devora...




Marcos Alderico
07/05/1995

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

O Encantador de Palavras



Sou encantador de palavras.
Lavro-as livres,
Leves como levo a vida,
Envolvidas em vazio e flores.
Palavras soltas no ar
Como a brisa à beira-mar.
Não as prendo aos limites dos livros.
São lindas lidas na lida
Do exercício dos amores.
(Para dizer que amo,
Picho-as nos muros,
Lanço-as na Net
Deito-as na rede e as amo).
Deleito-me no delito de amar sem a marca da culpa
A me atazanar.
Sou encantador de palavras
E mesmo quando a vida me divide,
Me divirto desvirtuando os sentidos
De tudo o que pareça claro
E declaro-me antagônico de tudo que seja óbvio.
O amor não é óbvio, por isso amo e não reclamo.

Marcos Alderico
03/02/2010
23:26h